Depois deste leque de opções não temos desculpa que nos impeça de ingerir cultura e é importante que o façamos, porque aquilo que nos distingue dos animais é a razão, razão essa que nos permite produzir e consumir a dita cultura
Crónica de António Ribeiro Telles
Os acontecimentos mais recentes têm-nos permitido viver algo nunca antes visto e presenciado que nos impede (à partida) de sair de casa. Ainda assim, o isolamento, quarentena para alguns, a que estamos sujeitos devido ao COVID-19 não pode ser desculpa para não seguirmos a nossa rotina e, principalmente, para não nos instruirmos na cultura, porque esta está à distância de um router.
Como membros que somos de uma sociedade temos de adquirir conhecimento, porque de nada nos vale a inteligência se depois não a sabemos usar. Dado isso, pecamos ao não conhecermos Benjamin Britten ou Maria João Pires no mundo da música, C. S. Lewis ou Francisco Palha no mundo da literatura, Jean-François Millet ou D. Carlos de Bragança no mundo da pintura, Robert Earl Wise ou Manoel de Oliveira no mundo do cinema, Andrés Roca Rey ou David Ribeiro Telles no mundo da tauromaquia. Podia enumerar ainda mais artistas nas vastas áreas que compõem a cultura, mas julgo estes serem suficientes para compreendermos a preponderância que a cultura assume.
Aproveitemos este tempo que nos foi “imposto” para o usar de maneira saudável e “usar e abusar” das tecnologias que estão à nossa disposição na formação de cada um. São várias as iniciativas e os projetos desenvolvidos para que a cultura não nos falte, que abaixo referirei.
Na área da música, com o objetivo de a levar a todos e de sensibilizar a sociedade portuguesa para ficar em casa, o Festival #EuFicoEmCasa, que começou no dia 17 de Março e termina dia 22, conta com intérpretes, músicos e autores nacionais que se organizaram para, a partir de suas casas, darem concertos com duração de cerca de 30 minutos, que são transmitidos em direto nas suas páginas pessoais de instagram.
Também a Brotéria, sendo uma casa de cultura dos jesuítas portugueses que conta habitualmente com uma programação, com o encerramento de muitos lugares de cultura desenvolveu o projeto Aos vossos lugares! desafiando uma comunidade de artistas, escritores, músicos e outros agentes culturais a criar «um momento de beleza e de silêncio», levando a literatura, a música e arte para dentro das casas de cada português.
De igual forma, a academia, através do projeto Memória Para Todos – ligado ao Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa – que visa a formação e investigação colaborativa e de ciência cidadã, lançou uma proposta na sua página de instagram e facebook, desafiando-nos a partilhar as nossas memórias através de um objeto importante da nossa vida e da nossa família. Contando a história sobre o mesmo e juntando uma fotografia e alguns hashtags como #memoriasdetrazerporcasa #fiqueemcasa, enriquecemos assim a memória coletiva da sociedade portuguesa.
No que diz respeito à museologia, as opções são muito vastas e diversas. Em Portugal, o Museu Calouste Gulbenkian permite fazer uma visita virtual pelas galerias da Coleção do Fundador e da Coleção Moderna, permitindo-nos vislumbrar uma das mais importantes coleções particulares de arte, e o Museu Casa da Moeda permite ver o seu acervo constituído por mais de trinta e cinco mil moedas. A nível internacional, a Pinacoteca de Brera (Milão), a Galeria dos Ofícios (Florença), os Museus do Vaticano, o Museu Arqueológico Nacional de Atenas , o Museu do Prado (Madrid), o Museu do Louvre (Paris), o Museu Britânico (Londres), o Museu Metropolitano de Arte (Nova Iorque), o Museu Hermitage (São Petersburgo) também permitem visitas virtuais, algumas em 360º.
Como se já fosse pouco, para além das opções literárias já referidas, a UNESCO permitiu o livre acesso à sua biblioteca online, deixando-nos à disposição um vasto conjunto de livros, filmes, documentários, etc., em várias línguas. E também o Teatro Politeama, a partir de dia 21 de Março e até dia 27, irá transmitir alguns dos seus espetáculos em direto na sua página de facebook, às 21h30.
Depois deste leque de opções não temos desculpa que nos impeça de ingerir cultura e é importante que o façamos, porque aquilo que nos distingue dos animais é a razão, razão essa que nos permite produzir e consumir a dita cultura. É realmente importante distrair-nos nesta altura com a beleza que a demais artes nos proporcionam e não estar sempre a falar ou ler informação sobre esta pandemia que nos assola, para bem da nossa sanidade mental.
Já dizia o visconde de Bonald que «a cultura forma sábios» e Portugal precisa deles.
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