Muitas foram as frases que marcaram o debate com todos os candidatos cujo partido teve ou tem assento parlamentar. Em especial, houve uma delas que me deixou um sentimento amargo e, ao mesmo tempo, doce. Quando questionado pelo moderador sobre por que razão Portugal tem sido ultrapassado nos principais rácios económicos pelos países de leste, a resposta de António Costa foi: “a História explica isso”.
de Gonçalo Brites Ferreira
Não é meu objetivo fazer suposições sobre qual é a história que António Costa tem para contar, muito menos qual a versão dos factos entende ser a que melhor corresponde ao que aconteceu na economia portuguesa.
O sentimento doce surge com a rúbrica “Economia Portuguesa” do Crónico. Recentemente abordámos a História da Economia Portuguesa, começando com a fraca adesão à Revolução Industrial, as reformas positivas, contudo, insuficientes do Fontismo, uma Primeira República de grandes desequilíbrios macroeconómicos e uma experiência traumática de financiamento da divida pública através da emissão de moeda. Seguiram-se o fecho da economia ao exterior no período do Estado Novo e a sua abertura nos anos 60, o começo atribulado da nossa democracia e das nacionalizações, as intervenções do FMI em 77 e 83 e mais recentemente os desequilíbrios externos na Balança Corrente e o pobre crescimento económico comparado com a média dos países da Europa.
O que me leva a um sentimento amargo, de preocupação com o futuro, é que estas mudanças de políticas, escorregões e quedas não só aparentam não servirem de lição como trazem consigo uma história que teima em não ser explicada: a evolução da dívida pública e as suas implicações.
Os debates a que assistimos centraram-se em questões que já devíamos ter deixado para trás. Não vou entrar em tópicos recém ressuscitados por populistas, apesar de há muito não fazerem parte do debate público, mas são temas que teimam em persistir na esfera da sociedade e que já devíamos ter abandonado.
Em Portugal, continua-se a debater quem deve ser o prestador dos serviços públicos, como a saúde e educação, porém, não debatemos o mais importante: a sua qualidade e a quantidade da oferta. Em Portugal, continua-se a debater a importância de empresas estratégicas e nacionalizações quando deveríamos discutir que tipo de ambiente competitivo, atrativo e que dê possibilidades de crescimento às empresas vamos criar em Portugal. Em Portugal, continua-se a debater a sustentabilidade da segurança social sem ter em consideração de que se o sistema não conseguir incorporar a evolução do crescimento económico e da inflação, nunca conseguiremos garantir um equilíbrio geracional, esquecendo desta forma a preponderância que os fundos de pensões têm na alavancagem das economias mais desenvolvidas.
Numa clara abordagem de manutenção do seu poder instituído, os partidos ao centro têm cedido aos partidos dos extremos que a má memória das suas ideologias sejam o tema do dia. E, enquanto nos focamos em questões puramente ideológicas, sem que tenhamos em conta aquilo que é feito nos países mais desenvolvidos, onde existe uma harmonia entre o setor público, privado e social, deixamos uma herança pesada às gerações futuras em forma de dívida pública.
A dívida pública que hoje temos assumiu proporções que deixam o país frágil e, de um modo sem precedentes, muito dependente das decisões do BCE. Num momento em que assistimos a uma inversão do comportamento dos juros, devemos estar conscientes dos perigos e restrições associadas e que, de facto, já não temos o espaço de manobra necessário para fazer reformas que precisamos.
No processo de escrutínio dos decisores políticos, é fundamental saber qual a herança que estes deixarão com os seus programas, mantendo a consciência de que se não invertermos a evolução da dívida estaremos a condenar as reformas do futuro, visto que as próximas gerações terão que gastar parte significativa do valor acrescentado que produzirão nas dividas que deixamos por pagar.
Não podemos deixar à deriva um país que vê cada programa de apoio que vem da União Europeia de forma sebastianista, como se da última e derradeira oportunidade se tratasse. Devemos sim, aprender com os erros da história e ter a honestidade de a contar por completo.
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