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A lei da nacionalidade



Crónica de leitor de Lourenço Paour


Aprovadas as alterações à Lei da Nacionalidade (Lei nº 37/81, de 3 de outubro) em 23 de julho de 2020, imagino que se tenham revelado uma surpresa para muitos, tanto pela parca discussão na sociedade civil em torno deste tema tão relevante para o nosso país, como pela residual referência a esta matéria na maioria dos meios de comunicação.


O projeto de alteração da Lei da Nacionalidade teve como principal objetivo ampliar o acesso à nacionalidade Portuguesa. O texto final votado é, portanto, a junção da proposta do PAN, que pretende alargar o acesso à naturalização às pessoas nascidas em território português após o dia 25 de abril de 1974 e antes da entrada em vigor da lei da nacionalidade, e da proposta do PCP que visa, também, alargar a aplicação do princípio Jus Solis previsto na Lei da Nacionalidade.

Mais especificamente, é de destacar agora a dispensa da necessidade de um descendente de 2º grau (neto), nascido noutro Estado, comprovar o vínculo com o cidadão português (avô) necessitando apenas de declarar que querem ser portugueses e que possuem laços de efetiva ligação à comunidade nacional. Entenda-se por ligação à comunidade nacional, o conhecimento da língua portuguesa e o facto de não ter sido condenado com pena igual ou superior a 3 anos. Esta alteração surge, deste modo, em benefício dos processos cujos sujeitos não conseguiam comprovar os vínculos exigidos pela legislação anterior (alteração ao artigo 1º da Lei).

Atinente aos processos para cônjuges de portugueses, estes deixam de estar dependentes do período de três anos, caso tenham filhos em comum com a nacionalidade portuguesa.


Relativamente à união de facto com nacional português, os processos deixam de precisar de ser através de ação judicial caso haja filhos em comum com nacionalidade portuguesa (alteração artigo 3º da Lei).

Por fim, a Lei concede, ainda, o direito de um menor nascido em Portugal, filho de pais estrangeiros, à nacionalidade portuguesa, se preencher um dos requisitos alternativos previstos: -Um dos progenitores tenha residência legal em território nacional; ou - O menor aqui tenha frequentado, pelo menos, um ano da educação pré-escolar ou ensino básico, secundário ou profissional (alteração ao artigo 6º da Lei).

Tais alterações não podem ser consideradas frívolas. Antes pelo contrário, antevê-se como consequência prática, um aumento dos pedidos de nacionalidade portuguesa nos próximos anos. Mas penso que seja mais premente abordar a questão de outros moldes. A lei da nacionalidade é, no fundo, a positivação do conceito de nacionalidade portuguesa.

Desta forma, parece-me que tais alterações foram discutidas na sociedade civil de forma demasiado perfunctória para que os portugueses percebam quais os motivos que levaram à ampliação o conceito “ser português”. A discussão foi feita de forma tão caricata que, numa circunstância em que um dos partidos propôs uma alteração do direito à nacionalidade portuguesa a descendentes de judeus sefarditas, para que tenham de residir em Portugal por mais 2 anos, houve quem, de uma forma arguta, os acusasse de antissemitismo. Uma acusação que claudica estrondosamente a todos os níveis, sendo mesmo burlesca de tão absurda que é, no entanto, nunca inócua, e nada pode ser mais revelador da infantilidade de alguns políticos com pastas tão sérias.

Não obstante, se os políticos não sentiram responsabilidade em promover uma discussão pública e sadia –presumivelmente por viverem numa bolha elitista que prefere corredores a ruas- infelizmente, a comunicação social também não. Publicaram-se alguns artigos, mas nenhum Expresso da Meia Noite nem um Prós e Contras, nada de substancial. Se o Deputado André Ventura tivesse levado este tema às redes sociais – e os mais atentos sabem bem porque não o fez- teria existido isso tudo. Enfim, em Portugal, parece não haver vontade nem sensatez para se discutir questões estruturais que não vendam jornais.

Cá para mim, apesar das alterações apelarem ao meu ideal globalista, penso que, quando se aprovou este projeto, se teve sobretudo em consideração o problema demográfico português. Desta forma, a meu ver, parece-me somente um reconhecimento político de que não se vai fazer o suficiente para que a nossa economia deixe de ser letárgica e incentive os portugueses a criarem famílias, mascarado de uma iniciativa inovadora e progressista. Na verdade, até me parece que os portugueses já se resignaram para facto do conceito nacionalidade ser apenas mais um chavão.


Se não discutimos sobre este tema, então não passamos de uns sul europeus que oferecem entradas para a Europa.





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