De Inês Vinagre
Wim Wenders voltou a surpreender com um novo filme em 2023. 'Perfect Days', foi nomeado para melhor filme estrangeiro nos óscares, aclamado quer pela critica, quer pelo público.
O interesse pela carreira cinematográfica do realizador cresceu, levando a uma re-descoberta do seu trabalho. Este ano tive o prazer de assistir no cinema Nimas, o meu filme preferido do realizador alemão, 'Asas do Desejo'. 'Asas do Desejo', é uma meditação na vida, e naquilo que é a passividade da mesma: o ato de observar, de se ser invisivel, sem participação.
Observamos Berlim; uma cidade dividida face aos acontecimentos da Segunda Guerra Mundial, onde paira a quietude e a melancolia.
Numa cidade de anjos, seguimos dois deles, Damiel e Cassiel, que pairam pela cidade: em cima de prédios, dentro de casas que não lhes pertencem, sentados num banco de jardim, a ouvir os pensamentos de por quem passam.
Os anjos são eternos, omnipresentes, observando as transformações da terra e dos seres humanos.
Filmada a preto e branco, nesta aura, quer mística quer de transparência à decadência, à melancolia, à separação da experiência da vida; é um filme sossegado e rotineiro, onde as rotinas dos cidadãos de Berlim ganham uma sensibilidade distinta.
E lhes dada uma atenção muito bonita, como se todos os gestos e todas as ações, fossem preciosos; momentos congelados no tempo, numa época tão instável socialmente, e que
por si mesmos merecem apreciação.
Comparando com as ruas, tantas delas desertas, vazias; entre o contraste dos anjos, eternos, omnipresentes; a vida eleva-se. Seguimos Cassiel, no seu desejo e fascinio pelo mundo a que não pertence.
Existe dentro de si um anseio pelo outro. Apaixona-se por uma trapezista de circo, maravilhando-se pela sua arte e a sua mente.
Este acontecimento faz com que finalmente tome a decisão que o inquieta à algum tempo: abandonar a imortalidade, e o seu estatuto de anjo, e pertencer ao mundo.
Mundo repleto de beleza, prazer humanos, e fragilidade; repleto de cor e incerteza. Porque não será por isso mesmo que vivemos? Onde a morte tem valor, viver é intrinsecamente uma necessidade e um risco.
Se existe algo que Wim Wenders é capaz é de mostrar a beleza e banalidade humana.
Ver os seus filmes é ao mesmo tempo, sair da sala de cinema com um temperamento soturno, mas ao mesmo tempo, com uma visão de apreciação pela vida, pelos seus pequenos momentos e, sobretudo, uma apreciação pelo intimo do outro.
Melhor que isso, só mesmo a grande atuação de Nick Cave & The Bad Seeds.
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