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Capital verde?

Atualizado: 16 de jan. de 2020

Há caminho para reclamar um capitalismo sustentável que preserve os inequívocos ganhos associados à propriedade privada e à procura do lucro e zele, em simultâneo, pela preservação do planeta, enquanto pressuposto essencial de uma economia de mercado sã



Lisboa recebeu, com pompa e circunstância, a distinção de Capital Verde Europeia para o ano de 2020. Em particular, não falta propaganda alusiva a um suposto novo ciclo para a capital.

Para além da positiva plantação de vinte mil árvores, o momento ficou marcado pelas promessas de um território mais verde, com o anúncio de um investimento público de 60 milhões de euros, essencialmente dirigido para acções de propaganda e promoção de iniciativas de cariz ambiental, bem como algumas resoluções micro para a melhoria da eficiência energética de Lisboa.

Contudo, num momento em que se exige uma acção estrutural que fortaleça uma resposta equilibrada em matéria ambiental, sobretudo em cidades com grande pegada ecológica (como revelam os resultados do projecto “Pegada Ecológica dos Municípios Portugueses”), é insuficiente uma programação que encara o Estado, materializado na autarquia, como o único impulsionador das iniciativas de conservação ambiental.

Uma aposta plena em políticas sustentáveis ultrapassa, e muito, a opção em torno das meras sessões de sensibilização ou da gestão urbana ordenadas pela esfera estatal. O “estatuto” que Lisboa recebeu deveria ser encarado como uma oportunidade para uma mudança concertada e transversal entre os vários agentes do sector público, privado e social, livre de dogmas ideológicos.

Na verdade, do ponto de vista das estratégias local e nacional, a solução não pode passar por um acantonamento da política ambiental em torno da administração pública. O debate deveria, antes, começar pela própria visão de um modelo económico precursor de uma transformação científica, gradual e popular de desenvolvimento sustentável, erguendo a Economia Verde, a promover pelos diferentes sectores, como o motor de uma mudança responsável. Aliás, a engrenagem da mudança podia partir da capital, atraindo o capital verde, enquanto elemento de um capitalismo que, ao contrário do que muitos apregoam, não está condenado a “matar o planeta”.

Muito pelo contrário: não só os custos da mudança não impedem que a qualidade de vida das populações aumente (veja-se o recente estudo da OCDE Investing in Climate, Investing in Growth, OECD Publishing, Paris), como há caminho para reclamar um capitalismo sustentável que preserve os inequívocos ganhos associados à propriedade privada e à procura do lucro e zele, em simultâneo, pela preservação do planeta, enquanto pressuposto essencial de uma economia de mercado sã.

Se temos uma vaga de decisores políticos que se deslumbra com o empreendedorismo, a criação de um ecossistema atractivo para o capital verde seria uma decorrência lógica e com resultados para um período que se deseja com impacto real, sob pena de mais uma vez ser uma acção inconsequente. Há múltiplas opções já testadas noutros países com sucesso, como é exemplo a assunção de opções fiscais que beneficie a adopção de factores de sustentabilidade em linha com as vertentes ambiental, social e governamental ("ESG"), ou a criação de um regime que promova produtos financeiros verdes (como são exemplo as green bonds).

Lisboa, para já, mostra ser um reflexo de uma política ultrapassada e que dificilmente compreende que há uma nova organização que suplanta o Estado. Há uma sociedade civil que se desenvolve de forma autónoma ao impacto político, que se evidencia no cidadão comum, nas associações e nas empresas. De nada valerá um galardão se este não viabilizar a criação de estímulos económicos e sociais, potenciadores de uma consciência colectiva, que motive aqueles que a tornam atractiva: a sociedade civil e empresarial que cultiva diariamente a vida das cidades.

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