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Desafiar a monotonia

A Fórmula 1 é única, porque é capaz de contrastar o individual com o coletivo. (...) a vitória é o produto de um trabalho iniciado nas fábricas, passando por engenheiros meticulosos, técnicos dedicados à causa e estrategas capazes de mudar o rumo de uma corrida numa pitstop inesperada.

Texto de Duarte Chastre


Acendem-se os cinco sinais encarnados, tudo pronto para mais uma corrida da Fórmula


Não há preço que pague o prazer de ver os vinte monologares alinhados na grelha de partida, com o desejo de ouvir tocar o seu hino nacional no final do dia. A magia da mais célebre competição de automobilismo do mundo está na conjugação entre as ambições pessoais de cada piloto e os objetivos conjuntos de cada equipa. A Fórmula 1 é única, porque é capaz de contrastar o individual com o coletivo. Se no final de um sempre imprevisível grande prémio da Emilia Romagna ou da mítica prova do principado monegasco, as câmaras apontam para o lugar mais alto do pódio (que tem sido invariavelmente britânico), a vitória é o produto de um trabalho iniciado nas fábricas, passando por engenheiros meticulosos, técnicos dedicados à causa e estrategas capazes de mudar o rumo de uma corrida numa pitstop inesperada.


A temporada de 2021, na ressaca de um 2020 atípico transversal a todo o desporto mundial, foi vista com um possível ano de mudança. Para um leigo na matéria, Fórmula 1 é sinónimo de Lewis Hamilton. O britânico, recordista e sete vezes campeão mundial, vai em busca de descolar de Michael Schumacher, num ano onde parece ter uma concorrência com maiores argumentos para o enfrentar. Derrotar Hamilton e, fundamentalmente, a Mercedes, é uma tarefa árdua para a Red Bull de Max Verstappen e Sergio Pérez. A contratação do mexicano foi, em termos estratégicos, uma jogada de mestre de Christian Horner, o team principal da Red Bull, oferecendo assim a Max um colega de equipa estável, veterano e, por consequência, com menos ambições de título do que o holandês de 23 anos.


Contudo, e apesar de um Red Bull que aparenta ser mais forte que o Mercedes, volvidas quatro corridas essa superioridade não se tem traduzido em frutos, visto que os alemães são, à data, a segunda equipa da história com maior número de pontos nesta fase do campeonato. Deixando de lado a raiva e a irritação de um fã de emotividade constante, é de louvar o trabalho realizado por Toto Wolff e a sua equipa, naquele que é o maior hino à consistência e racionalidade de que me recordo.


Ontem, mais uma vez, os alemães fizeram jus àquilo que são vulgarmente caracterizados, apresentando uma frieza de quem está habituado a lidar com a pressão de andar à frente. No grande prémio de Barcelona, Hamilton tinha a pole position, facto que não intimidou Verstappen, passando o holandês para a frente da corrida ainda na primeira volta, confirmando uma série de arranques espetaculares com que nos tem brindado. Aquilo que se seguiu foi a prova de que um piloto sozinho é tal e qual um oásis no deserto. A estratégia de paragens da Red Bull acabou por ser fatal, não estando à altura da surpresa da Mercedes ao parar Hamilton duas vezes num espaço de 13 voltas, permitindo ao (ainda mais) líder do mundial ter um jogo de pneus com maior fulgor do que Max, que rodou em pneus médios durante 36 voltas, terminando a ser naturalmente ultrapassado, perdendo uma corrida que devia ter ganho com o trabalho realizado na primeira curva.


Contada a história, resta à Red Bull crescer e não falhar na hora H a este nível. O desleixo do mecânico responsável por um dos pneus traseiros de Max pode ter custado aos austríacos o tão desejado mundial de construtores, que lhes escapa desde 2013. Para desafiar a monotonia, é preciso saber ser como ela. A continuar assim, tal como diz Gary Lineker sobre o desporto rei, no final ganham os alemães.

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