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Dia da Europa como Feriado. Porque não?

Atualizado: 15 de jul.

De João Campos

Uma primeira nota despolarizadora: este artigo não é nenhuma ode ao federalismo. Procura apenas concretizar um consenso que, em certa medida, entendo que já existe, embora pouco explorado. 

Mas vamos então tentar chegar ao fim do texto. 


A 9 de maio de 1950 a Europa estava na ressaca de uma guerra avassaladora. Várias forças começaram a alinhar esforços para concretizar uma ideia que, mais ou menos vagas, correram pensadores no século XIX e XX: construir uma Europa Unida.


Nesse dia, Robert Schuman, então Ministro dos Negócios Estrangeiros francês, fez uma declaração de intenções sobre o futuro da Europa que viria a lançar a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço. A partir da CECA, assinada em abril de 1951, a Europa caminharia para uma interdependência económica que garantiria a paz. As ideias mais ou menos abstratas de paz, divagadas ao longo dos séculos, teriam aqui uma concretização efetiva e pragmática, baseada numa intuitiva gestão de incentivos. E a verdade é que, dentro de portas, a Guerra terminou. 


O caminho feito desde aí todos, mal ou bem, conhecemos. A União alargou o seu âmbito, muitas vezes da necessidade repentina de dar resposta a uma crise, desenvolvendo esforços conjuntos e alicerçando-se em valores que, acredito, temos como chão comum dentro deste mesmo espaço de 450 milhões de pessoas.


A União significa coisas muito diferentes para cada um dos seus Países. O Continente Europeu é resultado de histórias e geografias muito distintas. Sabemos também que há Países mais europeístas que outros, uns que querem (e podem) ir mais rápido na integração e outros menos.


Em Portugal, embora o conhecimento sobre a União Europeia seja parco, existe um sentimento de agrado face ao Projeto Europeu muito transversal. Segundo o Eurobarómetro de maio de 2024, a maioria dos inquiridos em 21 Estados-Membros confiam na UE. 


Esse estudo indica que 68% dos portugueses confiam na UE, sendo o segundo valor mais elevado, em empate com a Lituânia e apenas atrás da Dinamarca com 69%. Já quando questionados se têm uma imagem positiva sobre a União, Portugal surge mesmo em primeiro lugar, também com 68%. 


Estes são números que podemos considerar elevados, sobretudo quando comparamos com a queda de confiança que os portugueses têm face a órgãos de soberania nacionais, como o Governo ou o Parlamento.


Numa recente sondagem do Expresso/SIC, elaborado pelo ICS/ISCTE, em parceria com a Comissão Comemorativa 50 Anos 25 de Abril, a entrada de Portugal na CEE foi a segunda data mais votada, a seguir ao acontecimento fundador da Democracia, como o momento mais importante da história de Portugal. 


Embora o 25 de abril estivesse muito à frente da adesão (65% para 11%), podemos pelo menos verificar que esta segunda data tinha mais apoio que a Implantação da República (8%), a Restauração da Independência (6%), a Batalha de Aljubarrota (3%) e a Chegada de Vasco da Gama à Índia (3%). 


Ora, quer a Implantação da República, quer a Restauração da Independência são feriados nacionais, mesmo estando pontos abaixo nesta hierarquia. E são porquê? 

Porque há um entendimento, mais convicto desde os tempos da Monarquia Constitucional, de que a figura do dia de descanso para celebrar eventos laicos ou religiosos lhes confere uma centralidade decisiva. Todas as sociedades necessitam de efemérides para refletir e contar a sua história.


Esse storytelling e reflexão faz tanto ou mais sentido quando os acontecimentos celebrados não são eventos remotos, mas sim episódios suficientemente recentes, relacionáveis ou que continuem em construção, como é o caso, por exemplo, do 25 de abril, o dia de Portugal e das Comunidades, mas também a pertença ao Projeto Europeu.


Ao longo da História de Portugal, feriados foram sendo colocados e adaptados. Vários deles com uma clara marca dos Regimes que se estabeleciam. A entrada na União Europeia é, não só, praticamente desde o início, trave-mestra do pensamento de quem nos guiou no pós-25 de abril, como a consequência histórica natural do caminho para uma Democracia Constitucional Pluralista num País com a nossa posição geográfica e social.


Aliás, o dia 9 de maio, surge, quase poeticamente, em sequência de calendário com as duas celebrações mais relacionadas com o nosso Regime atual: o 25 de Abril e o 1 de maio.

Num País onde a unanimidade sobre a Europa é considerável, mas a reflexão sobre ela não é muita, uma efeméride pode ser a melhor forma de conferir aprendizagem ao mesmo tempo que se enaltece os feitos do maior Projeto de Paz e Prosperidade que o Velho Continente já conheceu. 


A celebração do dia da Europa, que surgiu através de um Conselho Europeu de 1985, é feita um pouco por todo o espaço europeu, existindo alguns lugares onde a celebração alarga para mais de um dia. Ainda assim, esta proposta aparentemente mais ambiciosa que aqui faço não é totalmente inovadora, uma vez que no Luxemburgo, País tão ligado a Portugal, o 9 de maio já é feriado desde 2019.


Vivemos tempos paradoxais em que apesar da União atravessar enormes desafios e, talvez, uma crise existencial, a integração continua a aprofundar-se. Há várias visões da União e várias formas de ver Portugal dentro deste espaço, todas elas legítimas. Façamos essa reflexão, celebrando o que foi conquistado, com um dia que centralize a importância deste Projeto nas nossas vidas.

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