Urge haver opções distintas de escolha para que possamos usufruir de maior diversidade na oferta. Para isto, as escolas necessitariam de ter mais flexibilidade para definir os programas.
Crónica de Bernardo Rodrigues Ribeiro
Eu tenho um amigo, o Pedro. O Pedro fez 18 anos há pouco tempo e vai terminar o 12º ano no próximo Verão. O Pedro tem outro amigo, o Carlos. O Carlos tem a mesma idade e também vai terminar o ensino secundário em breve. Ambos são defensores acérrimos da liberdade e igualdade, separa-os os estabelecimentos de ensino que frequentam. Ao passo que o Pedro vai concluir esta fase do seu ciclo de estudos num estabelecimento de ensino privado, o Carlos andou sempre numa escola pública.
Os dois gostam de discutir política e entre copos trocavam uma série de acusações relativas à educação de cada um. O Carlos afirmava que o Pedro estava constantemente a ser favorecido por frequentar um colégio e o Pedro contra-argumentava, em tom de desabafo, que os seus pais nunca tiveram um único apoio do Estado na sua educação. Em choque, o Carlos acusou que a causa disto ter acontecido se devia ao facto de os pais do Pedro nunca terem acarretado com a escolha que o Estado lhes impingiu aquando do início do seu percurso académico. O Pedro advogou que a única escola da sua freguesia, e consequentemente única escola que podia frequentar, não oferecia as condições ótimas que os seus pais tinham em mente para a sua educação. Felizmente para ele, os seus pais tinham conseguido proporcionar-lhe outras condições num colégio do concelho, no entanto ele tinha inclusive uns vizinhos que curiosamente pensavam tal e qual a sua família. Todavia não conseguiram, por motivos financeiros, inscrever o seu educando num espaço de ensino com o qual se identificassem e tiveram que remeter a educação do filho para um estabelecimento de ensino que os deixa desconfortáveis. Indignado, o Carlos perguntou então o que Pedro sugeria para evitar estes casos e, por conseguinte, ter um sistema de educação justo e liberto para todos. O Pedro explicou através de um exemplo hipotético baseado em conceitos como a autonomia, meritocracia e a liberdade de escolha o que poderia proporcionar uma reforma moderada no atual sistema de educação:
Cada encarregado de educação teria liberdade para escolher o estabelecimento de ensino do seu educando, independentemente do rendimento do agregado familiar e área de residência. Por muito difícil que este caso possa parecer, se houvesse, por exemplo, um aluno de Viana do Castelo que quisesse deslocar-se todos os dias para uma escola em Ponte de Lima, o Estado não poderia sobrepor-se à escolha desta família. Quanto muito poderia facilitar-lhe a vida reduzindo os preços dos combustíveis. Esta libertação na escolha das escolas face ao Estado seria possível através de um sistema de diversas escolas públicas que podia ser posto em prática através de duas soluções: ou através do financiamento público a todas as escolas privadas quando destinados a beneficiários de ação social escolar, sem que as escolas privadas com isso vejam a sua autonomia limitada e se submetam à formatação cívica dos seus alunos que o Estado quer por vezes impingir através da obrigatoriedade de lecionação de partes dos programas académicos; ou através da alteração do critério de frequência das escolas, integradas na rede de ensino público, através de método de sorteio (por exemplo, são sorteadas uma percentagem de vagas no início dos ciclos (1º, 5º,7º e 10º anos) dedicadas a alunos de fora do local de residência onde a escola se situa, permitindo que, de acordo com as vagas disponíveis, estes escolham livremente o espaço onde querem estudar, sem amarras ao seu código postal, e sem comprometer o normal funcionamento da rede escolar nacional).
Posto isto, urge haver opções distintas de escolha para que possamos usufruir de maior diversidade na oferta. Para isto, as escolas necessitariam de ter mais flexibilidade para definir os programas. Nunca abdicando de alguns temas que teriam de ser estudados de forma comum em todos os pontos do país e que seriam fixados pelo Governo, até para efeitos de avaliação em exame nacional (a forma mais imparcial de avaliar a comunidade estudantil), as escolas também poderiam usufruir de autonomia pedagógica que lhes permitia dedicar mais tempo a explicar partes da História, que se ajustassem por exemplo à localidade geográfica e às respetivas comunidades locais; ou que lhes permitia tomar a decisão de tornar optativas disciplinas como cidadania, religião entre outras, desalocando o Estado do papel de criação de cidadãos livres e de consciência cívica, papel este que cabe também às escolas em gestão com a vontade das respetivas famílias. Talvez, desta forma, se justificasse a decisão e disposição de um pai de Viana de Castelo em transportar o filho diariamente para Ponte de Lima, só para poder usufruir de aulas de cidadania que não são dadas em mais lado nenhum, e assim ir de encontro aos valores que quer incutir no seu crescimento, sem ver a sua escolha balizada à vontade do Estado.
É ainda importante deixar a nota que estudos recentes revelaram que os professores que sentem níveis de desgaste mais baixos são aqueles cujas escolas interferem menos na autonomia pedagógica de cada um. Se são cada vez mais as pessoas com dificuldades em conviver com problemas de foro psíquico, seria importante a implementação de medidas que contribuíssem positivamente para o bem-estar mental da sociedade.
Em suma, o Pedro concluiu dizendo que posto em prática este sistema estaríamos a promover valores como a autonomia, e essencialmente promoveríamos o valor da liberdade de escolha tanto das famílias como dos quadros executivos das escolas. Tudo isto promoveria alguma competitividade entre as instituições de ensino que se veriam na necessidade de se auto desafiarem ano após ano a tornarem-se mais atrativas e consequentemente a fornecer melhores serviços de educação, que infelizmente é uma das poucas áreas em que as novas gerações, consideradas uma das mais bem preparadas para o futuro, se podem destacar e crescer independentemente do seu local de residência e agregado monetário.
Comments