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Erasmus e Tyler, The Creator: a maturidade de quem reconhece o fim

de Pedro Teixeira Brites


Praticamente não escrevo sobre a minha estadia de 5 meses na Grécia por diversos motivos.

Já foi há tempo suficiente para não sentir uma falta sufocante de toda a minha liberdade diária, mas ainda não passou tempo suficiente para eu desconstruir o quão importante foi viver 5 meses fora do meu país, sem pais, sem irmãos, avós e sem os amigos que via diariamente.


Quando cheguei, pela última vez, do aeroporto de Atenas, no final de fevereiro, fui recebido pelo meu pai (separado da minha mãe desde julho do ano anterior) e pela minha namorada. Ao vê-los, a felicidade por estar de volta era tanta que me entorpeceu durante uma hora, talvez um pouco mais. Estava feliz e ansioso por lhes contar tudo aquilo que guardei enquanto estive ausente, coisas que só se contam em pessoa, porque assim podemos partilhar a história com um sorriso e um tom de voz que só naquele momento faz sentido.


Assim foi. Muitos abraços, muitos sorrisos, falámos disto, daquilo, dos polacos que se queixavam do barulho e da senhoria que trazia bolo quando cobrava a renda. Naquela hora, entre sair do aeroporto e fazer o caminho para casa da minha mãe – que me esperava na sala – vivi momentos de felicidade e ingenuidade – da minha parte – por achar que estava tudo bem.


Ao chegar a casa, fui recebido e novamente abraçado. Estive talvez uns vinte, talvez trinta minutos a conversar com a minha mãe: sobre a vez em que um tupperware com canja foi lançado pela nossa janela, a professora de economia do trabalho que não sabia pronunciar palavras em inglês. Quando, cansada, subiu para o seu quarto, a minha mãe levou consigo o efeito sedativo que fui sentindo esmorecer ao longo daquela hora.


Falei com a minha namorada e, ao fim de alguns minutos a fingir que estava tudo bem, pousei a testa no ombro dela e comecei a chorar desenfreadamente. Chorei, e só depois de vários minutos é que parei.


Sou fã do Tyler, The Creator há algum tempo. Comecei a acompanhar verdadeiramente as suas músicas em 2019, com o lançamento de IGOR. O que mais me prendeu naquele álbum – que viria a ser aclamado como o melhor da carreira de Tyler até aos dias de hoje – foi a forma como ele conta a história, em várias camadas de uma experiência amorosa que corre mal.


O facto de existir uma nova personagem neste álbum, os vários hits reunidos, as performances ao vivo de músicas como New Magic Wand e todo o dramatismo crescente ao longo da segunda metade do álbum fizeram-me experienciar algo que nunca tinha vivido. São 40 minutos de um início, meio e fim que termina da pior – ou melhor – forma possível: “are we still friends?!”


Esta obra marcou profundamente a minha adolescência, e desde esse momento fui descobrir toda a discografia de um artista altamente controverso e camaleónico. As fases obscenas de Bastard e Goblin, a sinceridade de Flower Boy, as duas personalidades de Wolf – enfim, tornei-me um verdadeiro fã, e foi assim que, com entusiasmo, recebi o CMIYGL, um álbum que me voltou a marcar bastante.


Nesta segunda-feira, Tyler lançou Chromakopia. Like him, I Hope You Find Your Way Home, Darling I e Hey Jane são algumas das músicas que compõem o novo projeto de Tyler. Este é um álbum que demonstra a maturidade do norte-americano. Maturidade para reconhecer o erro, para admitir medo, insegurança. Não sou crítico musical, sou fã, por isso não digo que este álbum está bom ou mau; digo apenas que o estou a adorar pela forma como nós, ouvintes, somos colocados a observar a evolução de alguém que se reconhece com dúvidas, com medos e, acima de tudo, com a noção de que caminhamos, inevitavelmente, para um fim.


Quando pousei a minha testa e alguns caracóis negros no ombro da minha namorada e chorava, foi esta a noção que tive: que tudo termina e tem um fim. Com a idade que tenho, a maioria das histórias que tenho para contar ainda está a ser escrita num rascunho de um deus qualquer. Ainda falta muito para o fim, mas, com esta idade, começamos a notar que o mundo tem finais. Final do secundário, de amizades, de namoros. De projetos, de licenciaturas, de estágios e de empregos. Existem caras que nunca mais veremos, sabores que permanecerão uma última vez na nossa boca, mãos calejadas e enrugadas, com rugas mais velhas que nós, de que teremos de nos despedir. Sorrisos feitos na minha direção que nunca mais provocarei. Ondas que rebentarão e, diante dos meus olhos, consumarão morte, velório e funeral ao mesmo tempo.


Talvez por isso tenha chorado, naquele dia. Por saber que o fim se aproxima, por mais devagar que caminhemos, e que, a partir de agora, começamos a fechar tantas caixas quantas abrimos. E um dia, sem sabermos, veremos o pôr do sol pela última vez.

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