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Israel: a prova que genocídio e Jogos Olímpicos podem andar de mão dada

Atualizado: 24 de set.

de Pedro Teixeira Brites

Os Jogos Olímpicos começaram e posso dizer que este é dos eventos desportivos que mais me entusiasma. 

Os motivos para tal são variados, mas diria que o facto de ser disputado de 4 em 4 anos e de ser o apogeu de tantas modalidades (algumas bastante desconhecidas para a maioria de nós) deixa-me sempre colado a um evento que reúne os melhores de tantas e tantas modalidades.


O facto de ter passado alguns verões em casa das minhas avós também acaba por ser responsável por este meu fervor. Foram várias as modalidades que descobri em casa delas, em verões distintos, sentado na mesa de jantar da minha avó materna ou na poltrona da sala da minha avó paterna. 


Em Manique, na casa da minha avó do lado da mãe, descobri o hóquei de campo - modalidade inusitada que captava a minha atenção nas primeiras horas da manhã. Em Lisboa, na casa da minha avó Helena, vi os saltos de Nelson Évora e as lutas de judo mais ao fim da tarde. 


Seja pela RTP ou pela Eurosport, em casa das minhas queridas avós ou na minha própria, em Londres, no Rio ou em Tóquio, todos os JO que recordo me trazem felizes memórias e é realmente com muito entusiasmo que me preparo para acompanhar mais uma edição desta competição com tanta história.


Apesar de tudo isto, existe uma questão que me deixa apreensivo (uso este adjetivo para evitar o uso de “exaltado”, “revoltado”, “enojado” ou até mesmo “enraivecido” que acabei por utilizar neste pequeno aparte).


Vamos então falar do elefante na sala (ou do genocida em Gaza, como preferirem).


Recuemos uns anos, poucos, e observemos o que aconteceu, em termos desportivos, quando um país atacou outro país soberano.


A Rússia iniciou uma guerra num país vizinho onde dizimou inúmeras vilas, cidades e pessoas. A nível desportivo, FIFA e UEFA optaram por banir equipas russas e a respetiva seleção de participar em qualquer competição FIFA e UEFA.

Vou ignorar a discussão à volta desta proibição de participação em competições fora do país - será justo impedir atletas, clubes e fãs de viver o desporto como se vive em todos os outros países devido ao que os seus políticos decidem e fazem? - apenas porque já não é essa a questão que se discute agora.


Os  clubes e a seleção russa foram banidos. Trabalhemos sobre isso.

Embora todas as implicações que esta decisão teve e as questões morais a ela associada - imaginemos um país que, anos antes, tinha invadido um país soberano à procura de um tipo de armas de destruição massiva que nunca encontrou, mas nunca viu revogada qualquer participação em qualquer competição - ela foi para a frente e até hoje ainda está em vigor. Nos JO, no entanto, a questão é diferente. Os atletas russos (e bielorrussos) podem participar mediante o cumprimentos de um certo nível de requisitos: não apoiar ou ter apoiado a guerra na Ucrânia, não ter ligações ao exército e participar como independente (não estando associados ao seu país), são algumas das regras que estes atletas terão de cumprir para poderem estar em Paris. 

Mais uma vez, ignoremos a discussão sobre estas restrições, o ponto não é esse. 


A questão central é a seguinte: se um país que invade outro sofre consequências desportivas por fazê-lo (o próprio país, os clubes e os atletas), porque é que um país que comete um genocídio participa tão livremente em toda e qualquer competição?

Perante as quase 40 mil pessoas mortas, as mais de 15 mil crianças assassinadas, a destruição de 77% das instalações sanitárias, de 68% de infrastruturas de telecomunicações e 60% das instituições de ensino em todo o território de Gaza, o comité olímpico, a FIFA e a UEFA continuam inativas na concepção de qualquer tipo de castigo a um país que mata crianças queimando-as vivas ou que bombardeia campos onde os palestinianos se refugiam, depois de verem destruídos os seus lares.


Não há, para a FIFA, UEFA ou para o COI, qualquer problema que um país que está a cometer um genocídio (não sou eu que o digo, é a ONU) e que está ilegalmente a ocupar um território (mais uma vez, quem o diz não sou eu, mas sim o TIJ) participe nas suas provas ou competições. 

Resta-me apenas ter um sentimento de pesar por todos os 400 atletas olímpicos Palestinianos que não poderão participar nestes jogos olímpicos, por terem sido mortos ou feridos.


Resta-me apenas o sentimento de pesar por todas as mais de 15 mil crianças mortas que nunca chegarão a ver, como eu sempre vi em casa das minhas avós, modalidades inusitadas e desportos a atingirem o seu auge durante umas semanas.


Resta-me apenas o sentimento de pesar por toda a comunidade que está demasiado ocupada a tentar fugir das bombas, a ir para zonas de evacuação que serão bombardeadas ou que tenta alcançar os suprimentos que os israelitas não destroem à entrada de Gaza, para apoiar os seus atletas, os seus heróis.


Resta-me apenas desejar sorte a todos os 8 Palestinianos que chegaram até Paris para representar não só a Palestina, mas também todos aqueles que se solidarizam com o ato desumano que o seu povo sofre.


Um dia, daqui a uns anos, aqueles que aplaudem os chefes de estado que pugnam pelo extermínio de todo um povo talvez sejam responsabilizados.

Bem como todos aqueles que praticam crimes de guerra na tentativa de apagar da face da terra a Palestina ou aqueles que veiculam propaganda de um país que afirma ter uma das capacidades militares mais elevadas do planeta mas que, aparentemente, não consegue matar terroristas do Hamas sem antes dizimar milhares de civis.


Não peço, por isso, que Israel seja banido de toda e qualquer competição desportiva por achar que isso resolve algo. Peço-o apenas para que não se esbarre de nariz num muro de hipocrisia já habitual no nosso mundo.


Por isso e porque não existe nenhuma modalidade nos JO que inclua matar civis à queima roupa ou dilacerar crianças com bombardeamentos ou à fome - na qual, certamente, Israel disputaria as medalhas de ouro todas.


Por fim, até admitiria curiosidade em perceber como será a participação nos JO de uma nação que comete um genocídio, mas basta recuar até 1936, para, com a Alemanha nazi, ver um caso semelhante.


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