As universidades têm um papel primordial de cultivar o pensamento crítico, funcionando como uma alavanca do desenvolvimento social. Repudiamos as recomendações do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e de todas as Universidades que decidiram adiar os exames para o segundo semestre.
Manifesto de Raquel Moreiras e João Moreira da Silva
Estudantes de Direito, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Ao longo das últimas semanas, tem reinado entre os alunos do Ensino Superior a inquietação e a desorientação em relação ao método de ensino que continuará a ser adotado dentro das Universidades. Face à situação pandémica crítica, foi recomendado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior que as instituições “mantenham as avaliações presenciais consideradas essenciais e que não podem ser adiadas.” Seguindo esta recomendação, várias universidades anunciaram o adiamento de exames para o segundo semestre, em vez de os realizarem online nas datas previstas do primeiro semestre.
O conceito do “rigor académico” tornou-se o argumento dominante para justificar este adiamento. Desde representantes políticos, professores e demais membros de órgãos de gestão das universidades, vemos reproduzidos ataques à credibilidade e honestidade dos estudantes. Os alunos passaram a ser tratados como criaturas desonestas, ansiosas por terem exames online para poderem copiar - como se quem quer copiar não o pudesse fazer em exames presenciais, de qualquer forma.
Assim, milhares de estudantes de todo o país estão a ver os seus exames de primeiro semestre ser adiados para o final do ano letivo devido a esta obsessão cega com o “rigor académico” - por outras palavras, do medo das cábulas em casa. Exames que poderiam ser realizados online na maioria dos cursos são adiados por receio de que os alunos copiem e tirem melhores notas do que nos exames presenciais.
Acreditamos que o “rigor académico” não deve imperar se tiver a desvalorização da palavra dos estudantes enquanto pilar. O adiamento dos exames é apenas mais um dos sucessivos golpes ao movimento estudantil - mais um passo para desacreditar os estudantes e as suas reivindicações, tratando-os como crianças que têm de ser controladas num anfiteatro enquanto fazem um teste. Graças a estes golpes, no final do ano teremos um acumular de exames que em nada terá contribuído para adquirir conhecimento nem para a saúde mental dos estudantes - tudo isto realizado em nome do “rigor académico.”
Acreditamos que a escolha de defender o ensino presencial em detrimento do ensino à distância faz todo o sentido, uma vez que o fecho das instituições prejudica os alunos em condições desiguais, afetados por uma ação social incapacitada e por um desinvestimento crónico no Ensino Superior. No entanto, este adiamento exames em nada ajuda os alunos - muito pelo contrário, só os coloca numa posição ainda mais desigual. A verdadeira ajuda, nesta fase extrema da pandemia onde infelizmente o ensino presencial não pode ser garantido, seria garantir a todos condições para realizarem os exames online na data prevista, com distribuições de routers e computadores a quem precise destes - não passa por sujeitar todos a um acumular de provas no final do ano.
As universidades têm um papel primordial de cultivar o pensamento crítico, funcionando como uma alavanca do desenvolvimento social. A resposta dos responsáveis políticos não pode passar por retirar a validade às reivindicações estudantis, questionando a nossa integridade. Enquanto estudantes do Ensino Superior, repudiamos as recomendações do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e de todas as Universidades que decidiram adiar os exames para o segundo semestre. O “rigor académico” não pode cegar os responsáveis políticos. Queremos ter os exames nas datas previstas - e queremos que todos tenham acesso aos meios para os realizarem nestas datas. Exigimos ter uma palavra a dizer, num apelo geral a uma postura estudantil interventiva e mobilizada para a valorização dos instrumentos reivindicativos e democráticos dentro das Instituições de Ensino Superior e da voz dos estudantes na luta pelos nossos interesses.
Assinam este manifesto os estudantes:
Raquel Moreiras, estudante da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
João Moreira da Silva, estudante da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Afonso Fernandes, estudante do Instituto Superior Técnico
António Vaz Pato, estudante da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa
Francisco Colaço, estudante da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa
Diogo Vintém, estudante da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Luísa Agapito, estudante da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
João Vassal, estudante da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa
Ana Carolina Fagundes, estudante da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa
João Gonçalves, estudante da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Tiago Santos, estudante do Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa
João Miguel de Sousa, estudante da Faculdade de Medicina da Universidade dos Açores
Diogo Castanheira, estudante da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico do Porto
Tamara Pylypenko, estudante da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico do Porto
Gonçalo Caldas, estudante da Faculdade de Letras da Universidade do Porto
Rodrigo Silva, estudante da Faculdade de Letras da Universidade do Porto
Gonçalo Angeiras, estudante da Faculdade de Direito da Universidade do Porto
Inês Ferreira, estudante da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto
André Lima Machado, estudante da Faculdade de Direito da Universidade do Minho
Afonso Maia Silva, estudante da Faculdade de Direito da Universidade do Minho
Mourana Monteiro, estudante da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade do Algarve
Tiago Lucas, estudante do Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa
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