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Nós tratamos disto

Crónica de João Moreira da Silva

Estudante de Direito na FDUL


Há menos de uma semana, um grupo de 100 pessoas juntou-se pelo direito à objeção de consciência de pais que não queiram os seus filhos nas aulas de Educação para a Cidadania.


Entre as assinaturas do abaixo-assinado, contam-se vários ex-dirigentes políticos do nosso país, assim como várias pessoas ligadas à Igreja Católica. Por coincidência, a sua média de idades está nos “sessentas”.


Combinando esta faixa etária com as matérias lecionadas na disciplina, parece-me totalmente compreensível que estas pessoas tenham subscrito este abaixo-assinado:


Em 1976, altura em que a maior parte dos signatários andava na escola, a participação de mulheres na composição inicial dos Governos era de 1.9%. Hoje em dia é de 30.5% - é compreensível a sua aversão à matéria de educação para a igualdade de género.


Em 1979, altura em que a maior parte dos signatários já tinham saído da escola, realizou-se a primeira conferência do clima, em Genebra. Muito lentamente, começava a levantar-se o tema das alterações climáticas pelo mundo fora - é compreensível a sua aversão à matéria de educação ambiental e desenvolvimento sustentável.


Só em 1984, quando a maioria dos signatários do abaixo-assinado já estavam no mercado de trabalho, é que a Assembleia da República aprovou a primeira lei sobre a Educação Sexual, depois de fortes polémicas face ao aumento de gravidezes indesejadas e dos abortos – é compreensível a sua aversão à matéria de educação para a saúde e sexualidade.


Assim, um grupo de pessoas com uma média de idades superior a 60 anos explicou ao país quais eram os valores morais certos e errados para este país. Para sua infelicidade, estão perante uma geração de indigentes e hippies que não tem problemas em falar de igualdade de género, sexualidade e multiculturalismo numa sala de aula – ou fora dela.


Os tabus dos anos 60, 70 e 80 não são os mesmos que nos dias de hoje. Por essa mesma razão, a minha geração assistiu perplexa a um debate que poderia ter tido lugar há 40 anos no parlamento. Os políticos que decidiram abraçar esta causa conseguiram distanciar-se ainda mais de uma geração que apresenta uma taxa de abstenção superior a 70%.


A preocupação com o livre desenvolvimento da personalidade das crianças é louvável. Mas nós, que fomos mais expostos a este tipo de educação que abrange o ambientalismo, a igualdade de género e a sexualidade, apresentamos os melhores resultados. O nosso país, ainda que longe de perfeito, está melhor servido com uma geração consciencializada como a nossa. Porquê dar um passo atrás?


Agradecemos as intenções – mas nós tratamos disto.

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