Neste dia do pai, recordem os vossos pais do amor que nutrem por eles, e da sorte que é tê-los nas vossas vidas. O amor de um pai constrói uma personalidade forte e sem medos, a ausência, quando ainda não se é crescido o suficiente para se poder afirmar que “é a vida”, cria almas frágeis e eternamente saudosas.
Crónica de Maria Francisca Gama
No dia em que se celebra o dia de todos os pais, e nestes tempos em que, tantos de vós, foram obrigados a passar mais tempo com os vossos, peço, por favor, que não se esqueçam de os recordar de como a sua presença vos engrandece.
Ainda que nem todos os pais sejam os melhores do Mundo, e que, para tantas crianças e jovens, exista uma busca incessante, tantas vezes ingrata, de uma figura paternal que lhes mostre as coisas bonitas da vida que só se veem às cavalitas de um homem, quero acreditar que a maioria de nós teve a sorte de ter um pai como nos livros. Um pai que nos leu livros à noite. Que nos ensinou, por vezes mais alto do que aquilo que os nossos corações pareciam aguentar, o que podemos ou não fazer; que nos ajudou a andar pela primeira vez de bicicleta com confiança, sem as suas mãos nas nossas costas para que não tivéssemos medo de cair. É engraçado como, até nas coisas mais pequenas, a que já não damos valor, tantas vezes só precisávamos, apenas, que o nosso pai nos fizesse acreditar que conseguiríamos. Afinal, pensem para vós: como se ensina a andar de bicicleta senão só e apenas pelo incentivo de que, se cairmos, alguém nos erguerá?
A vida com um pai é boa, e a segurança de que teremos sempre alguém, provavelmente mais robusto do que a nossa mãe, a proteger-nos e a garantir-nos de que ninguém nos fará mal, coloca-nos numa bolha – fosse ela indestrutível -, que nos permite arriscar e sonhar.
Quantas vezes disse coisas que não podia, a quem não devia (creio, hoje, fruto da rebeldia da idade), ciente de que se corresse mal, o meu pai me salvaria? E quantas vezes não dei o meu melhor, quando me atrevi no desporto, expectante de que o meu pai reparasse e já não dissesse que, nisso, não saía a ele?
O meu pai ensinou-me muitas coisas sobre ser pai, sobre ser família, e tudo o que isso envolve: vi-o a ser bom quando as coisas foram fáceis, e recordo-me ainda com mais admiração de como foi quando as coisas eram difíceis, de como aí ainda era melhor. Ensinou-me também a ser mãe, e, mais do que qualquer outra coisa, ensinou-me a ser mulher. Com o meu pai não senti que o meu lugar era na cozinha (até porque era ele que a comandava), mas tive a certeza de que o meu lugar é em qualquer lado do Mundo. Com o meu pai aprendi que não devo ter medo, e que devo ser exigente em relação a mim, mas também em relação aos outros – no amar, no viver, no respeitar.
Um dia o meu pai disse-me que acreditava que eu ia trilhar o meu caminho sozinha, e que, o que quer que eu quisesse, conseguiria. Nem sempre o ouvi, e tantas vezes o desafiei, mas sei que a fé que depositou em mim me tornou responsável.
Houve dias em que não quis saber o que ele tinha para dizer, e quantas outras fiz o oposto dos seus conselhos. Creio que faça parte do crescimento, esse sentimento de impunidade, de sabedoria infundada, de independência receosa. Muitas vezes reconheci que tinha razão, e noutras, ainda que o soubesse, deixei que o orgulho tomasse conta de mim. Sei que não se importou, afinal, o meu pai nunca quis ter razão.
O dia de todos os pais também é o dia do meu. Aliás, para mim, todos os dias são do pai, do meu. Vivo há seis anos consciente de que o meu pai me acompanha e vigia, e só eu sei o peso que é ter os seus olhos castanhos a depararem-se com as noites em que bebo demais, ou os dias em que não correspondo às suas expetativas.
Sei que é normal, com o passar dos anos, construirmos a nossa família. Deixarmos de ser nós e os nossos pais, para sermos nós e os nossos filhos. O pai que fica avô, a mãe a quem pedimos que tome conta. Os almoços passam a ser só aos domingos, e de pai que dá colo passará, eventualmente, a pai com quem falamos ao telefone em momentos de aflição.
Neste dia do pai, recordem os vossos pais do amor que nutrem por eles, e da sorte que é tê-los nas vossas vidas. O amor de um pai constrói uma personalidade forte e sem medos, a ausência, quando ainda não se é crescido o suficiente para se poder afirmar que “é a vida”, cria almas frágeis e eternamente saudosas.
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