O público alvo do meu texto poderiam ser as mulheres, mas não o vai ser. Apesar de não começar com algo apelativo como “o Rúben Dias está se a tornar o melhor central português” ou “o Ronaldo já não devia marcar os livres”, peço aos homens que se esmerem, aguentem o texto e não vão embora como o Abel.
Texto de Maria Madalena Freire
Mestrado em Jornalismo na NOVA FCSH
A luta feminista do início do século XX tinha objetivos muito simples e concretos: o direito ao voto e a ocupação da mulher no espaço público. Sim, a mulher podia sair à rua, mas sempre acompanhada ou com autorizações. Demoraram vários anos até a mulher se conseguir cristalizar como cidadã com os mesmos direitos e deveres aos olhos dos seus pares. Foi conquistando pequenas grandes coisas, o voto, algumas liberdades como ter a sua própria conta no banco, ter a custódia dos filhos, poder viajar sem autorização do marido, poder ser algo para além de enfermeira ou professora, frequentar o ensino superior e muitos mais.
Hoje em dia, fala-se muito da mulher já em posições de destaque. Há o lado que diz que há muita pedra para cascar, há outro que diz que agora é deixar as coisas fluir. Sim, a mulher já se faz valer mais no espaço público mas parece que ainda há sítios interditos e que ninguém menciona, ninguém questiona, toda a gente aceita, porque sempre foi assim e “assim sempre será”.
O futebol. Mulher que gosta de futebol, que comenta ou arbitra jogos ou é “Maria rapaz”, ou é lésbica, ou é “pouco feminina” entre muitas outras coisas. Pouco vemos e ouvimos caras e vozes femininas no futebol, porque é um espaço intensamente “masculinizado”, é uma área onde os “machos” têm escapatória da fêmea, podem desanuviar, dizer palavrões, mandar os seus bitaites, estar com os amigos e serem essencialmente homens. É uma distração, é um entretenimento que passou a grande negócio mundial.
A mulher ainda não conquistou o seu lugar na esfera futebolística, mas há exemplos a realçar nesta luta do início do século XXI. Primeiro, a UEFA ao contratar a Stephanie Frappart para arbitrar jogos como champions, a premier league ter fiscais de linha do sexo feminino (apesar de o Irão cortar a imagem do jogo cada vez que esta aparecia). Segundo, o canal 11, a exemplar plural, diversificada e inclusiva estação da Federação Portuguesa de Futebol que, em toda a sua normalidade, tem mulheres que comentam, que apresentam e que falam abertamente, sem escrúpulos de táticas, estratégias, jogadores e arbitragem. Claro, há sempre um aconchego menos bom do Maniche a chamar homem à Sofia Oliveira no Futebol Total (programa do canal). No entanto, a Sofia e também a Márcia são como iguais, têm o mesmo tempo de antena, a mesma relevância e a mesma atenção.
É lhes exigida exemplaridade, porque têm de se fazer valer num terreno que ainda não lhes pertence. O meu pai nunca via futebol comigo, sempre me achou demasiado emotiva. O meu pai não queria bem saber o que é que a comentadora tinha a dizer sobre o 3-4-3 de Ruben Amorim. Hoje, não há um jogo do Sporting que não me ligue a seguir para comentarmos.
Estranha-se, depois entranha-se. Porque no fundo não passamos de Pessoas que se irritam porque uma bola não rola da forma como desejaríamos.
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