De vez em quando chega-nos aos ouvidos um ou uma artista que não necessita mais do que um nome para ser automaticamente reconhecível. Às vezes, também, não é preciso mais do que um acorde para sabermos identificá-los
de Mª Madalena Freire
Esses artistas, muitas vezes conotados de ora de de divas, ou presunçosos pela fama, sucesso e reconhecimento internacional que alcançam, aparecem-nos constantemente na rádio, no Spotify em Hits of Today ou nos vídeos mais vistos no Youtube.
No entanto, existem aves raras que são como aparições na nossa vida que se recolhem e se resguardam do mundo após lançarem um álbum e fazerem a respetiva digressão, para viver a sua vida, como nós estamos a viver a nossa. Deixam-nos, assim, um legado de mais ou menos 10 músicas para nos acompanhar nos próximos 5 ou 6 anos de hibernação até regressarem.
E nós lá vamos aguentando, aproveitando restos e sobras de artistas semelhantes que vão lançando músicas ao longo dos anos - máquinas produtivas "fordistas", mecanizadas, que muitas vezes já nem recorrem à inspiração, criatividade, mas à fome de alcançar ainda mais streams, mais lucro do que o hit anterior.
Ontem, tivemos o privilégio de ouvir a primeira nova música desde 2015 de uma diva das baladas melancólicas, cuja imagem de marca é estampar os seus álbuns com a idade que os fez. Muitas vezes os seus álbuns contam estórias do período marcante que passou e, agora, pronta para lançar dia 19 de Novembro o álbum 30, faz-nos relembrar que começou todo este percurso com o 19, atravessando os 21 e os 25.
Infelizmente, atravessei a sua mágoa de todos os álbuns com a idade inadequada - as suas dores de 19 anos espelhavam a minha dor de 9? As suas dores de 21 refletiam as minhas de 11? E a dos 25 as dos meus 15?
Não, não era sequer remotamente igual, mas o que esta artista faz de forma tão genial é escrever letras tão pessoais que se podem interpretar, adequar, transformar em qualquer dor que estejamos a ultrapassar e facilita um bocadinho mais quando nos permite gritar por “outro alguém” ou “rebolar no fundo”.
Não era alcóolica aos 15, não me divorciei aos 22, mas a magia das músicas que ouvimos está exatamente na interpretação que nos deixa identificar nelas. Seja naquelas duas ou três notas que soam no piano que nos fazem arrepiar, seja naquele bridge que nos rebenta com a emoção antes da música culminar, seja pelas cordas vocais inabaláveis e intocáveis que se parecem interligar com as artérias do seu coração e soam na coluna do nosso carro.
Sim, admito algum cansaço de algumas músicas que foram excessivamente tocadas, repetidas e chacinadas em programas de rádio ou The Voice, mas se forem agora ouvir com a atitude de realmente ouvir, vai arrepiar como da primeira vez.
Com 17 anos fui sozinha assistir a um concerto em Lisboa, normalmente algo que achamos ser uma experiência partilhada. Mas eu sabia que não precisava de companhia, quando a música é uma experiência partilhada por si só, partilhada no isolamento interpretativo de cada um de nós.
E poucos o conseguem fazer como a Adele.
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