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Pôr os jovens no holofote das Artes


Entrevista a Associação de Jovens Artistas Portugueses

Francisco Belo e Melissa Colaço



Portugal é um país feito de obstáculos para quem quer vingar tanto no mundo da ciência como no mundo das artes. Perante os desafios cada vez maiores para os artistas que estão neste momento a iniciar as suas carreiras, nasceu um grupo de jovens em plena pandemia para dar resposta a essa falta de visibilidade: a Associação Jovens Artistas Portugueses. O Crónico esteve à conversa com os directores Francisco Belo, estudante de Design e Cultura Visual no IADE, e Melissa Colaço, mestranda em Museologia e Museografia na Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa (FBAUL). Conversámos sobre um projecto que promete oferecer uma alternativa a estudantes do meio artístico que querem dar a conhecer o seu trabalho à comunidade.



António Vaz Pato (AVP): A Associação de Jovens Artistas Portugueses (JA) “surgiu para dar resposta à necessidade de divulgar jovens artistas na produção artística”. Quando e como nasceu esta vossa iniciativa?

Francisco Belo (FB): O projecto nasceu em 2019. É uma história muito engraçada. Eu estava no secundário e sentia que muita gente não sabia se queria realmente seguir Artes. Para mim, fazia sentido haver qualquer coisa que pudesse juntar mais estas pessoas: um espaço ou sítio onde as pessoas pudessem dialogar e criar projectos juntos.

Quando eu ia a exposições reparava que havia muitos jovens artistas que gostariam de expor e não tinham essa oportunidade. Houve uma vez que eu vi um espaço que estava vazio no centro de Lisboa e fui falar com o proprietário. Ele disse que tinha planeado reabrir o espaço como restaurante na semana seguinte, mas que durante aquela semana não teria lá nada. Eu achei um desperdício, não podia acontecer! Todos os metros quadrados em Lisboa são valiosos. Perguntei se podia fazer uma exposição durante uma semana. Ele ficou surpreendido, mas aceitou. Lancei uma open-call na internet e tive muitas respostas. A exposição teve a contribuição de 25 artistas e tivemos cerca de 350 visitantes, o que para mim foi um sucesso.



AVP: Foi nesse momento que tu pensaste que, com esse modelo que tu inventaste assim quase de improviso, podias fazer a diferença? Por outras palavras, replicando isto várias vezes ao longo do tempo, sentiste que poderias dar um contributo forte para o aumento da visibilidade dos jovens artistas portugueses?

FB: Exacto, mas eu também notava que faltava qualquer coisa. As pessoas não entram intuitivamente numa galeria ou num museu. E foi a partir daí que surgiu o meu segundo projecto. Em 2020, a Melissa participou numa das exposições com um formato semelhante durante a quarentena. Fizemos uma exposição num túnel com as obras impressas em formatos de grandes dimensões. Foi aí que o desafio surgiu: se a arte não consegue chegar às pessoas, como é que a arte pode ser mais interventiva?



AVP: E foi a partir desse momento que organizaram uma equipa para dar resposta a esse desafio. Quando arrancou a vossa actividade?

Melissa Colaço (MC): A equipa começou oficialmente em Janeiro de 2021 e registámo-nos como associação em Setembro desse ano. Durante os confinamentos, fizemos várias exposições virtuais e várias intervenções em espaços exteriores.



AVP: Conseguem fazer-me um retrato geral da equipa? O que vos une?

FB: A equipa tem esta particularidade, que eu acho que nos distingue de outros projectos, que é este sentido de compromisso que temos com a missão da associação. Dialogamos e debatemos constantemente a forma como podemos crescer entre as diferentes comunidades artísticas em Portugal. Não é só mais um ponto na nossa agenda.

MC: No início, foi um pouco complicado, houve muitas saídas e entradas de pessoas na equipa. Neste momento somos quatro.



























Legenda: A equipa actual da JA (da esquerda para a direita): Tomás Saraiva, Melissa Colaço, Francisco Belo e Margarida Ribeiro.



AVP: Fizeram várias exposições nos últimos tempos, têm um podcast - chama-se 0.25 e está disponível nas plataformas usuais - e estão muito activos nas redes sociais. O que veem como mais desafiante nas vossas iniciativas?

FB: O que sobressai são claramente as exposições. Tem sido o grande desafio: fazer as parcerias com as juntas, por exemplo. Nós abrimos inscrições com candidaturas e depois há uma fase de selecção. Este ano acolhemos dois grupos de 8 pessoas, pois só participam 8 artistas por exposição. Para criar uma dinâmica colectiva, adoptámos outra abordagem na associação que são os grupos de jovens: são feitas reuniões com artistas de vários locais do país para estes jovens poderem partilhar as suas experiências e trabalhos, com currículos muito diferentes.

MC: Tivemos esta semana no Beato uma exposição e dois workshops em duas escolas.

FB: Sim, é verdade. Foi muito positiva a experiência com as escolas. Trabalhámos com 30 crianças e tivemos a sorte de alguns dos nossos artistas terem colaborado connosco.




Legenda: Instalações de três exposições concretizadas nos últimos tempos pela JA. As estruturas são montadas em formato triangular e dão a conhecer obras de 8 artistas selecionados pela JA (da esquerda para a direita): JA em Alvalade, JA em Loures e JA em Telheiras. As exposições resultaram de parcerias com os órgãos e entidades locais.



AVP: Que projecto vos marcou mais em particular, de todos o que já fizeram até agora?

MC: Eu destacaria a exposição virtual [“Começa a Diferença”] porque foi uma iniciativa diferente. Deu uma perspectiva original às pessoas na altura do confinamento.



AVP: Como funcionam estas exposições virtuais?

MC: Há um link que remete literalmente para uma sala virtual e que as pessoas conseguem percorrer tal como se estivessem numa galeria. Ainda está disponível na Internet para quem quiser visitar.

FB: O que me marcou mais foi a exposição JA em Alvalade. Foi a primeira vez que montámos as nossas estruturas para exposição e eu estava muito receoso. Foi um investimento pessoal e poderia não ter muito sucesso. No entanto, foi um formato que estudámos em conjunto e provou ser uma maneira de expor completamente diferente, prática e intuitiva para o público.



AVP: Têm várias parcerias com artistas. Como tem sido a resposta por parte destes jovens? Sentem que o seu trabalho é mais valorizado com a vossa ajuda?

MC: Eu sinto muito isso. Através das nossas redes sociais damos bastante visibilidade. É uma óptima ferramenta de divulgação.

FB: Concordo. Os artistas ficam muito gratos. Queremos que isto seja uma experiência marcante para quem trabalha connosco. Penso que o grande desafio é mesmo a comunicação. É uma relação muito exigente. Já vários curadores salientaram este desafio. De vez em quando não temos resposta da parte deles, mas também temos vindo a aprender a comunicar melhor.



AVP: E a ligação ao público? O que falta fazer para construir mais pontes entre as pessoas e a cultura e as artes. O que vos diz a vossa experiência no terreno?

MC: Por exemplo, as estruturas que montamos no exterior são uma excelente forma de fazer essa ligação. A pessoa não tem de se dirigir à galeria ou ao museu, conseguem ver a arte de forma mais passiva.



AVP: As pessoas sentem-se provocadas por essas intervenções no exterior. Esse primeiro contacto é o mais difícil?

FB: A frase mais típica em Portugal é que “a arte não dá no nosso país”. A educação tem um papel central e muitas vezes essa transmissão aos jovens não é feita da melhor forma. Até num outro ponto, sinto uma frieza enorme quando entro numa galeria ou num museu, porque não há uma procura de contacto entre o público e o espaço em si. Eu acredito que a arte é importante até como ferramenta de auto-conhecimento, de questionamento ou reflexão. As obras podem ter esse impacto na vida das pessoas. Temos de trabalhar mais essa conexão.



AVP: Vocês estão numa fase muito determinante nas vossas vidas, estão a transitar do meio académico para o meio profissional e esta transição acarreta muitos desafios, problemas e oportunidades. Que avaliação fazem do estado da cultura e das artes em Portugal? Sentem que o nosso país pode valorizar mais o vosso trabalho no futuro?

MC: Em Portugal, há um grande contraste entre os dois grandes centros – Lisboa e Porto – e o resto do país. A diferença vê-se, por exemplo, aqui na Margem Sul onde eu moro, junto a Lisboa. A nível de espaços culturais e artísticos temos talvez a Casa da Cerca e pouco mais.

FB: O que eu sinto é um pouco o mesmo. Já existe alguma vontade e iniciativas para mudar isso. No entanto, para vingar cá em Portugal é preciso trabalhar o dobro. Há uma exigência para fazer sempre mais, mais e mais.



AVP: O que está na agenda da associação num futuro próximo?

FB: Depois destes tempos de pandemia, vamos finalmente ter um espaço no qual vamos receber artistas para fazer podcasts e outras actividades. Vamos ter uma exposição em Junho em Alvalade, a convite da Junta de Freguesia. Ainda não temos uma programação muito preenchida, mas as coisas vão surgindo.



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