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Stephanie Kelton

O maior constrangimento associado ao orçamento do estado é, para os defensores da MMT, a inflação. Perguntam-se se temos os recursos reais, como infraestruturas, profissionais dispostos a trabalhar, matérias primas para suportar o que queremos construir? Criar dinheiro não provoca inflação, mas gastá-lo pode.

Texto de Beatriz Viana



O trabalho de Stepanhie Kelton nos Estados Unidos influencia decisões políticas e orçamentais e tem vindo a agitar as águas em toda a academia económica monetária, com a introdução da teoria denominada de Teoria Monetária Moderna (em inglês, sigla MMT). A Modern Monetary Theory é extremamente controversa (para muitos até louca), mas não impediu o livro da economista O Mito do Défice de se tornar num best-seller mundial em 2020.



Stepanhie Kelton é professora de Economia e Políticas Públicas na Universidade de Stony Brook. Economista líder no campo da MMT, foi conselheira económica da campanha de Bernie Sanders nas presidenciais de 2016, e ocupou o cargo de Chief Economista no Comité Orçamental do Senado americano. Com comentários políticos mediáticos nas rádios e na televisão internacional, Kelton foi considerada pelo POLITICO como uma das 50 pessoas mais influentes no debate político americano.


Em que se focam, então, as suas investigações e conclusões? Kelton responde: “em melhor formas de construir”. Construir economias focadas no combate ao desemprego, na garantia de educação, de saúde e de alojamento acessível a todos. Ora, para assegurar a oferta destes serviços públicos, a economista defende que é necessário desestigmatizar a maneira como olhamos para os Gastos Públicos: libertar da conceção associada a acumular dívida, para o foco na contribuição financeira para o objetivo comum do crescimento económico. Kelton considera que grandes economias como os EUA já têm os recursos que necessitam para reparar o sistema, apenas precisam de acreditar que é possível.


Como é possível? A professora explica que, em primeiro, é preciso fazer as perguntas certas: em vez de “como vamos pagar isto?”, pensar se “será que isto vai contribuir positivamente para a sociedade?” e “temos os recursos reais (como fábricas, trabalhadores, matérias-primas) para apoiar o investimento?”


Elaborando na Teoria Monetária Moderna, segundo os seus defensores, esta consiste numa descrição verídica de como uma moeda funciona realmente. O raciocínio base defende que economias que emitem a sua própria moeda podem sempre financiar-se a si mesmas com essa mesma moeda.


Assim, para grandes economias como os Estados Unidos, o Reino Unido ou o Japão, arranjar dinheiro para suportar necessidades da sociedade nunca poderá ser um problema, porque o dinheiro não acaba - cria-se mais. A Reserva Federal americana, por exemplo, está interligada com o restante sistema financeiro eletronicamente, e não tem de existir sequer mais impressão de dinheiro, porque, na era moderna, tudo é digital.


Se o Estado quiser aumentar a despesa pública, poderá fazê-lo, portanto, sem ter necessariamente de aumentar impostos. A economista argumenta que é necessário mudar o paradigma de que impostos é a única maneira que o estado tem para pagar as contas. Kelton descarta, assim, a má reputação associada ao défice, e recusa-a a ter esta diferença entre receitas e gastos como limite ao investimento público.


O maior constrangimento associado ao orçamento do estado é, para os defensores da MMT, a inflação. Perguntam-se se temos os recursos reais, como infraestruturas, profissionais dispostos a trabalhar, matérias primas para suportar o que queremos construir? Criar dinheiro não provoca inflação, mas gastá-lo pode.


A teoria provoca vários debates entre políticos e académicos, como o reputado economista Paul Krugman. As principais críticas elencam o modelo de inflação utilizado, que pode sobrestimar as receitas que surjam da criação monetária e o potencial da política fiscal e orçamental, subestimando o poder da política monetária para os ciclos económicos, pelo que não é suficientemente credível para justificar programas de gastos públicos massivos.

A teoria apresentada por Kelton e explorada no Mito do Défice é, sem dúvida, ambiciosa e disruptiva. Contagia debates e desafia as visões mais liberais dos mercados. Leitura recomendada para quem quiser pensar e repensar nos modelos monetários capitalistas, com a ajuda de mais uma mulher economista.

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