Texto de Francisco Lemos Araújo
Rúbrica Aspas Aspas
De quatro em quatro anos a chama acende-se e dá-se início a um dos eventos desportivos mais aguardados.
Os Jogos Olímpicos (JO) assentam em três valores simples: Amizade, Respeito e Excelência. Como qualquer competição, os JO exigem, de todos os atletas, a superação, física e mental, na procura de alcançar a sua melhor prestação desportiva, representando, pelo seu simbolismo, o pico da carreira de qualquer atleta.
Porém os JO são muito mais do que a melhor e mais variada competição desportiva do Mundo. São um momento de união, partilha e integração multicultural que quebra quaisquer barreiras, são a representação dos sonhos da sociedade na procura de um mundo mais igual, pacífico e solidário, assente na convicção de que o desporto tem esse poder transformador.
2020 seria mais um ano em que viveríamos o espírito olímpico e Tóquio prometia-nos um evento de excelência, com uma organização ímpar. No entanto, a realidade que hoje nos foi imposta pelo surto pandémico da Covid-19 obrigou a que, tudo aquilo pelo qual ansiávamos viver, fosse adiado.
Já sob pressão de alguns países que haviam pedido o adiamento de Tóquio 2020 (entre os quais Portugal) e as decisões da Austrália e Canadá de não enviarem quaisquer atletas, caso a realização dos JO se mantivessem para as datas inicialmente previstas, o Presidente do Comité Olímpico Internacional (COI), Thomas Bach, e o primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, “concluíram que os Jogos Olímpicos (e Paralímpicos) de Tóquio têm de ser adiados para uma data posterior a 2020, mas nunca para lá do Verão de 2021, na salvaguarda da saúde dos atletas e de todas as pessoas envolvidas nos Jogos Olímpicos e de toda a comunidade internacional.”.
Esta decisão era já há muito esperada, tendo havido quem criticasse a demora do COI e do Japão em anunciarem aquilo que era inevitável, considerando que deveriam ter sido estes a dar o exemplo à sociedade e não a sociedade a pressionar para que a decisão fosse tomada. Naturalmente, as razões de saúde pública sobrepõem-se a qualquer outro aspecto no âmbito de uma decisão deste tipo e, aceitar que milhões de pessoas (atletas, treinadores, representantes, espectadores, etc.), provenientes dos mais diversos cantos do Mundo, passassem por Tóquio em Julho e Agosto de 2020, por maior que fosse o controlo, seria irresponsável e altamente ameaçador de todos os esforços realizados, presentes e futuros, para a contenção desta pandemia.
No entanto, não nos podemos esquecer que os JO são o maior evento desportivo à escala global e que acarretam um investimento, de tempo e dinheiro, em infraestruturas, logística e preparação dos atletas apurados, que, sendo especialmente avultado para o país organizador, também o é para os restantes países.
O COI e o Japão têm agora em mãos a difícil tarefa de procurar atenuar o mais possível os impactos económicos e sociais do adiamento, tentado compatibilizar o investimento feito para a realização do evento com os compromissos já assumidos, com vista ao retorno do mesmo.
Um dos exemplos desta operação envolve a Aldeia Olímpica, local onde todos os atletas, treinadores e outros representantes das comitivas ficam alojados durante o período dos JO. Uma vez terminados os Jogos Paralímpicos, os apartamentos seriam requalificados e, posteriormente, vendidos e arrendados, sendo que parte desses apartamentos já se encontram vendidos. Assim, o adiamento dos JO para 2021 implica que, ou as ditas requalificações e os negócios que envolvem os apartamentos sejam todos adiados para data posterior à realização dos JO ou, então, que a organização fique sem Aldeia Olímpica, tendo de procurar novas soluções (situação que parece pouco provável).
Também os demais países suportarão custos. Pense-se, por exemplo, nos encargos com o prolongamento, por mais um ano, dos ciclos de preparação dos atletas, que terão de ser suportadas pelos clubes, federações e comités olímpicos nacionais.
Mas as consequências desta decisão não têm um impacto apenas económico. Também os grandes protagonistas, os atletas, que têm vindo a preparar-se física e mentalmente para os JO, veem todo um planeamento a “ir por água abaixo” e a ter de ser redefinido em consonância com as novas datas. Sendo ainda verdade que, para alguns destes atletas, que contavam terminar a carreira após estes JO de 2020, o adiamento da competição para 2021 pode significar um adeus diferente do que haviam planeado.
Todos os factores devem ser tidos em conta quando se toma uma decisão desta magnitude, por isso, a demora acaba por ser, neste caso, um reflexo da dimensão dos próprios Jogos Olímpicos.
Não nego (e creio que ninguém o faz) que seria uma lufada de ar fresco se, neste próximo Verão, todos nós pudéssemos ligar a televisão, a rádio ou abrir as redes sociais e acompanhar de perto a festa e as emoções que se vivem nesta grande competição, especialmente em 2020. Seria um sinal de força e união, de que havíamos conseguido ultrapassar as adversidades que hoje sentimos, o sinal de que tudo voltara à normalidade.
Mas essa vontade não se extingue, apenas se prolonga por mais um ano, até que possamos, de novo, viver o olimpismo com uma intensidade reforçada.
Agora que as novas datas foram anunciadas, com os JO a realizarem-se de 23 de Julho a 8 de Agosto e os Jogos Paralímpicos entre 24 de Agosto e 5 de Setembro, resta-nos aguardar que todos se possam preparar da melhor forma possível para que, no fim, possamos dizer quem foi mais rápido, mais alto e mais forte em 2021.
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