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What If - A Alvorada de 11 de Março

Atualizado: 15 de jul.

De Eduardo Moita


Nos últimos dias tenho lido um livro escrito sob o pseudónimo Diogo de Andrade cujo título é a “Alvorada Desfeita – E se o 25 de Abril Tivesse Falhado”.


Alvorada é uma história de ficção política que, como tantas outras, altera um facto histórico relevante para contar uma história que nunca aconteceu, mas podia perfeitamente ter acontecido.


No caso, o golpe militar do dia 25 de abril de 1974 falhou e a História como a conhecemos não aconteceu, tendo corrido um curso alternativo que o autor desenvolve de forma engraçada e sustentada. What if, como dizem os ingleses.

Pois bem, what if o PSD não tivesse vencido no dia 10 de março? O que teria acontecido se o centro-direita tivesse perdido a terceira eleição seguida em 8 anos? Nunca aconteceu.


Depois de Mário Soares em 1976, vitória da primeira AD; depois de novamente Mário Soares em 1983, vitória de Cavaco Silva; depois de Guterres em 1995 e novamente em 1999, vitória de Durão Barroso; depois de Sócrates em 2005 e novamente em 2009, vitória de Passos Coelho; e, agora, depois de António Costa em 2019 e novamente em 2022, vitória de Luís Montenegro. Ou seja, o PSD escapou do que nunca lhe aconteceu: perder três eleições seguidas.


E se não tivesse vencido estas eleições? Disse, a quem me quisesse ouvir, que nestas eleições o PSD jogava a sua penúltima vida.


Teria estas eleições como a primeira de duas vidas para ir verdadeiramente a jogo, para disputá-las com hipótese de as ganhar, e teria depois, como prova final, uma última vida com Carlos Moedas.


Se não tivesse vencido


Se não tivesse vencido no dia 10 de março, teria pela sua frente o terrível dilema de, havendo uma maioria à direita, aprovar orçamentos à esquerda.


Num primeiro momento, o partido não faltaria à sua palavra. Não se juntaria com o Chega numa coligação negativa contra o PS, mas pagaria um preço muito caro por honrar esse compromisso ético.


Nas eleições seguintes, muito provavelmente provocadas por uma moção de rejeição entretanto apresentada pelo PSD e votada com o Chega, o partido que hoje é a noz do quebra-nozes (PS de um lado, Chega do outro) estaria ainda mais encalacrado.


Pagaria um preço político muito caro por mandar um Governo abaixo e por antes disso ter suportado esse mesmo Governo que acabara de aniquilar.

Uma contradição política insanável perante dois eleitorados diferentes. De um lado e de outro, o PSD estaria em muito maus lençóis.


Do lado do eleitorado móvel do centro, seria penalizado por causar instabilidade ao interromper a governação.


Do lado do eleitorado da direita dentro e fora do seu partido, seria penalizado por ter suportado, ainda que indiretamente, um Governo do PS quando este estava já há 8 anos no poder (e, especialmente, quando em 2015 chegou ao Governo tendo ficado em segundo lugar nas eleições). Seria um autêntico pesadelo.


Certamente o PSD perderia muitos votos para um lado e para o outro.


Contudo, este cenário poderia ser um pouco menos adverso, e é aí que entraria a última vida do PSD.


As coisas poderiam ser atenuadas se o descontentamento com mais um Governo do PS e com o status quo parlamentar que o suportasse viesse de dentro do PSD, e não de fora.

Uma espécie de Nova Esperança versão século XXI contra o bloco central (que, neste caso, não seria bloco central coisa nenhuma, mas que diríamos que sim para criar o facto político relevante).


Um movimento, muito provavelmente protagonizado por Carlos Moedas, que começaria com uma disputa interna dentro do partido e cuja principal bandeira do challenger seria apresentar-se contra o bloco central vigente através do qual o PSD estava a suportar um Governo minoritário do Partido Socialista.


Depois disso, ganhando o partido, o challenger recém-eleito provocaria então novas eleições dizendo que o eleitorado do PSD não “nos deu mandato para suportar um Governo do Partido Socialista em modelo bloco central” (lá está o facto político relevante).


Seria um cenário perfeito? De todo. As hipóteses de o PSD vingar neste cenário também seriam poucas.


Tanto neste caso, como no primeiro, teria provocado eleições depois de ter apoiado um Governo do PS – o que certamente lhe sairia caro ao centro e à sua direita. Seja como for, num e noutro caso, a hipótese mais provável seria o PSD perder novamente as eleições – as quartas de seguida, portanto.


Veríamos um dos partidos fundamentais do sistema diminuir, tornar-se num partido médio e pouco relevante para as contas de quem ganha.

A partir daí, seria muito provável que a nossa vida coletiva passasse pelo Partido Socialista ou pelo Chega – pelo Partido Socialista, portanto. Os eleitores do centro-direita ficariam sem casa-mãe. Um pesadelo.


O que (de facto) aconteceu


Não foi isso que aconteceu. O PSD passou esta prova de vida. O resultado não é expressivo. Nada disso.


Mas se quisermos por as coisas em termos qualitativos, nada mudou no que eram as hipóteses de governabilidade do PSD.


Vai governar em minoria e não havia nada que apontasse noutro sentido. Sempre foi isto e não vale a pena pensar que poderia ter sido outra coisa, pois nenhuma sondagem o disse.

O número de deputados que o PSD teve – a vitória curta, como diria um simpatizante, ou a vitória de Pirro, como diria um adversário – não muda nada do que sempre seria (ou, na opinião de quem escreve, deveria ser) a estratégia do partido.


Paradoxalmente, numa fase de vida ou de morte do PSD, saiu-lhe a sorte grande. No dia 10 de março, o PSD tornou-se no partido central do sistema, no pivot da Assembleia da República.


Para o derrubar, é preciso que o Chega e o Partido Socialista somem os seus votos e depois expliquem ao respetivo eleitorado que a esquerda (laica, republicana, europeísta e socialista-democrática) e a direita (radical, populista, soberanista, nativista e muitíssimo antissocialista) juntaram os seus votos.


Depois será também preciso explicar ao grande centrão por que razão mandaram o Governo abaixo. Aí, o PSD gritará em alto e bom som que não o estão a deixar governar, que houve vontade de mudança, mas que o Chega e o Partido Socialista não a estão a permitir.


O PSD dirá que, por um lado, há um partido que está a criar instabilidade depois de ter estado oito anos no Governo; por outro lado, há um partido que com a sua jogada irresponsável poderá por o país em risco de voltar a ter o Partido Socialista no poder.


Não obstante as coisas não serem tão simples relativamente ao eleitorado do Chega, não gostava de estar na pele dos dois partidos.


É natural que para tudo isto suceder, ou melhor, para que tudo isto tenha mais hipóteses de suceder, o PSD honre o seu compromisso ético e político.


Ético no caso do Chega, político no caso do PS. Não pode o PSD comprometer-se com nenhum, deve apenas comprometer-se consigo mesmo, com o seu eleitorado, repetindo ad nauseam que ganhou as eleições e que tem um mandato para governar nos termos do qual se obrigou a um não é não explícito e a um não haverá bloco central implícito.


Se mostrar ao grande eleitorado – ainda representa quase 60% – que está aqui para defender os valores de uma economia de mercado, do Estado Social, da liberdade, da igualdade e da ética na política, e se se mostrar como o porto-seguro desses valores e conquistas, poderá ter-lhe saído a sorte grande.


Lucrará também se, no âmbito dessa estratégia, der algum protagonismo a quem está à esquerda do PS e a quem está à direita da AD, retirando algumas luzes ao líder da oposição – os extremos, eu e mais ninguém, eis a questão.


Para tudo isto, Luís Montenegro vai ter de (Emmanuel-)Macronizar.

O mesmo é dizer, vai ter de fazer do PSD um partido de charneira que dança entre a direita radical e uma provável frente de esquerda.


Durante a campanha o antigo nadador-salvador surpreendeu todos pela positiva, mostrando que é frio e não tem estados de alma.


Parece-me ser politicamente mais inteligente do que o crédito que lhe davam, pelo que vamos ver se tem unhas para tocar esta guitarra.

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