De Bianca Castro
“Os riscos referentes ao calor extremo, como exposição a incêndios florestais e à seca, já estão em «níveis críticos» em Portugal”, informa-nos o estudo publicado na semana passada pela Agência Europeia do Ambiente.
A crise climática não é uma previsão futura, mas uma sucessão presente de catástrofes cada vez mais devastadoras.
Pelo mundo, vivem-se cenários apocalípticos com recordes a serem batidos em todas as frentes.
A Europa não só é o continente onde a temperatura irá aumentar mais depressa, como está impreparada para combater os riscos climáticos.
2023 foi o ano mais quente alguma vez registado, com a temperatura média global entre fevereiro de 2023 e janeiro de 2024 a exceder os níveis pré-industriais em 1.5ºC - a meta de aquecimento ditada pela ciência climática.
A Agência Europeia do Ambiente destaca que, em muitos casos, a adaptação progressiva não será suficiente: é necessária uma ação urgente.
Dos 36 grandes riscos climáticos identificados, mais de metade exigem uma ação imediata; muitos dos riscos já atingiram níveis críticos, que se tornarão catastróficos se não forem tomadas medidas urgentes e decisivas.
Trata-se não só de conservar ecossistemas, mas de proteger as pessoas contra o calor, contra inundações, contra incêndios florestais.
Destacando o tópico da alimentação, temos que o sul da Europa encontra-se num nível crítico derivado do calor e da seca - as secas prolongadas, como as que já temos enfrentado, representam uma ameaça inignorável para o abastecimento de água potável, a produção agrícola e a segurança alimentar.
A Seca
As secas constituem uma das facetas do colapso climático.
Além das suas consequênciasmmais óbvias -, como a redução dos caudais dos rios, do nível das barragens e da disponibilidade de água para a agricultura e consumo humano -, o custo da água aumenta, e também o da eletricidade, devido às restrições na produção de energia em barragens.
Torna-se mais caro alimentar os animais pois os pastos secam; e a vegetação espontânea não floresce, o que afeta a vida dos insetos e compromete a polinização de árvores de furto e outros cultivos alimentares.
Consequentemente, o aumento dos preços dos alimentos faz-se também sentir e compromete o acesso das pessoas a bens alimentares essenciais.
O Verão de 2023 foi o mais quente da Terra desde o início dos registos globais em 1880, de
acordo com os estudos do Instituto Goddard de Estudos Espaciais (GISS) da NASA. Neste
momento, já nos encontramos no décimo mês seguido mais quente de sempre.
Olhando para o Algarve, uma das regiões mais afetadas pela seca em Portugal, vemos uma
situação de seca extrema e severa; reservas de água a atingirem níveis críticos, aquíferos sobrexplorados e poluídos, ecossistemas em risco.
Sendo impossível dissociar os impactosmsociais e económicos, vemos também agricultores com escassez de água, obrigados a adotar as culturas e áreas cultivadas à água disponível, e uma população que teme ficar sem água nas torneiras.
O Governo já anunciou medidas para reduzir os consumos e racionalizar a água, como cortes de 25% na agricultura (mas que nalguns casos chegam aos 50-70%) e de 15% no setor urbano.
Mas estas medidas não resolvem este que é um problema estrutural de falta de água, nem constituem uma estratégia a longo prazo que garanta sustentabilidade hídrica.
Atualmente, centenas de agricultores pelo país estão em aflição e muitos, na região algarvia, em protesto.
Com palavras de ordem como “água é vida, agricultura é alimento” e “só percebemos o valor da água depois de a fonte secar”, denunciam aquilo que consideram falta de equidade nas medidas do Governo, nomeadamente a proibição de novas áreas regadas e os cortes anunciados poderem levar à seca de hectares e hectares de pomares.
Plantar em vez de protestar?
Ora, qualquer ativista climático já ouviu o típico comentário de que “devia era ir plantar
árvores” em vez de protestar; na semana passada, vimos o Climáximo ceder e fazer
Apenas com um senão… foi no campo de golfe de Oeiras que plantou árvores e legumes, denunciando o quão impensável é continuar a usarem-se recursos energéticos e água para a manutenção de campos de golfe, enquanto agricultores se manifestam por falta da mesma.
Ao enquadrar-se esta ação no conceito de justiça climática -, que encara as alterações
climáticas como um complexo problema político de justiça social -, tornam-se claros os
motivos por trás da escolha do local.
Numa situação de emergência como a que vivemos, não deveria ser possível continuar a priorizar consumos de luxo e sem utilidade social; o uso de recursos naturais escassos como a água deve ser planeado e gerido em função dos interesses e necessidades essenciais das pessoas, como é o caso da produção de alimento.
Em tempos de seca, como é que priorizar o uso da água para bens essenciais pode ser controverso?
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