Sincopado #3 - Os Imortais
- Crónico.
- 16 de fev. de 2021
- 3 min de leitura
Na última semana perdemos dois grandes da música, Chick Corea, pianista americano e o Professor Joel Pina, viola-baixo de Amália Rodrigues. Dois nomes de mundos que têm uma relação de amizade muito bonita em Portugal, o Jazz e o Fado.
Seleção de Cristina Rogeiro
Cantora e estudante na Escola Superior de Música de Lisboa
“You have got to create the space, then fill it”
Chick Corea foi um dos maiores nomes do Jazz de sempre, herói de muitos músicos e compositor dos icónicos “Spain”, “La Fiesta”, “Armando´s Rumba” e “Windows”. Tinha uma grande capacidade de entreter e tocar o público, o que não é tão habitual num instrumentista como num cantor, porque mais do que um pianista excecional era um verdadeiro intérprete.

Começou como acompanhante de grandes artistas e mais tarde foi revelando o seu inegável talento para a composição, liderando vários grupos. Tocou na banda de Miles Davis na década de 60, fundou o quarteto de free jazz Circle e liderou uma das mais influentes bandas de jazz fusion dos anos 70, os Return to Forever.
Foi influenciado pelos clássicos do bebop como Dizzy Gillespie, Charlie Parker e Bud Powell, tendo também contactado com a música clássica. Tinha uma clara influência da música latino americana, fundindo o jazz com o flamenco, em grupo com os Return to Forever ou em dueto com a sua mulher, a cantora Gayle Moran, no disco “My Spanish Heart”, utilizando o piano como um instrumento percussivo também, já que aos 8 anos experimentou a bateria. Tocou com artistas como Blue Mitchell, Keith Jarrett, Dave Holland, John Mclaughlin, Al di Meola, John Patitucci, Bobby McFerrin e tantos outros. Atuou pela última vez em Portugal em 2015 no EDP Cool Jazz, com o seu grande amigo Herbie Hancock.

Os seus discos mais importantes que ficam para a história do jazz e da música são “Now He Sings, Now He Sobs” de 1968, “Paris Concert” 1972, com o grupo de free jazz Circle, “Light as Feather” 1973 com Return To Forever e “Trilogy” de 2013 ao vivo com o baixista Christian McBride e o baterista Brian Blade.
Chick, para além da sua obra deixa uma última mensagem muito bonita aos artistas, especialmente numa altura tão desafiante para os mesmos:“ É a minha esperança que aqueles que tenham inspiração para tocar, escrever ou interpretar o façam. Se não for por vocês que seja por todos nós.
Mestre, Professor e Senhor do Fado
Nascido em 1920, Professor Joel Pina, assim carinhosamente chamado pelos músicos, introduziu a viola-baixo no Fado e acompanhou a fadista Amália Rodrigues durante 30 anos e várias gerações seguintes. Começou no bandolim e quando veio para Lisboa passou a frequentar as casas de Fado, acabando por escolher a viola-baixo por sentir que era diferente e que poderia acrescentar valor. Foi convidado por Martinho d’Assunção para o seu trio e fez parte do grupo de guitarras de Raul Nery, rapidamente tornando-se numa referência no baixo-acústico.

Conheceu Amália Rodrigues em 1950 e em 1954 foi convidado a participar no filme “Os Amantes do Tejo”, no qual a fadista aparecia e, a partir desse momento, acompanhou-a até ao final da sua carreira. Esta experiência de uma vida que lhe trouxe tanta alegria pode ter sido o segredo para uma longa vida de 100 anos- No entanto lamentava que muitos músicos do Fado de hoje não tivessem tido a oportunidade de ouvir Amália ao vivo.
Para além da fadista, acompanhou artistas como Carlos do Carmo, Tristão da Silva, Maria Teresa de Noronha, João Braga, Ricardo Ribeiro e Cristina Branco. Ao longo da sua carreira gravou cerca de 300 discos e teve um contributo determinante para a consagração do Fado como Património Cultural Imaterial da Humanidade.

No ano passado, celebrou os seus 100 anos com vários artistas que o homenagearam num concerto no Teatro São Luiz, promovido pelo Museu do Fado. O concerto que voltou a ser transmitido na semana passada, para recordar o professor, contou com Mariza, Ricardo Ribeiro, João Braga, António Zambujo, Teresinha Landeiro, Gaspar Varela, Matilde Cid, António Pinto Basto e tantos outros. É importante ver e rever este concerto que referencia os que já partiram, aqueles que acompanhou toda a vida e os que com o seu apoio deram os primeiros passos e lembrar um homem com tanta vida para se contar. Joel Pina fica agora para história do Fado e de Portugal. Para sempre Mestre, Professor e Senhor do Fado.
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